9/24/2007

TGV ao serviço de quem?


A viagem entre Copenhaga a Estocolmo de comboio, através de florestas geladas e planícies brancas a perder de vista, demora cerca de cinco horas num comboio que só se diferenciava dos nossos Alfa por ser menos luxuoso e dotado de menos serviços de apoio aos passageiros.

Não fora ser crítico do projecto TGV e conhecer a realidade económica e social desses países, daria comigo a pensar que os nórdicos, emblemas únicos dos superavites orçamentais, seriam mesmo uns tontos. Quem nem os conhecesse bem perguntaria onde gastam eles os abundantes recursos resultantes da substantiva criação de riqueza .

A resposta está na excelência das suas escolas, na qualidade do seu ensino superior, nos seus museus e escolas de arte, nas creches e jardins-de-infância em cada esquina, nas políticas pró-activas de apoio à terceira idade. Percebe-se bem porque não construíram estádios de futebol desnecessários, porque não constroem aeroportos em cima de pântanos nem optam por ter comboios supersónicos que só agradam a meia dúzia de multinacionais,

O TGV é um transporte adaptado a países de dimensão continental, extensos, onde o comboio rápido é, numa perspectiva de tempo de viagem/custo por passageiro, competitivo com o transporte aéreo.

É por isso, para além da já referida pressão de certos grupos que fornecem essas tecnologias, que existe TGV em França ou Espanha (com pequenas extensões a países vizinhos). É por razões de sensatez que não o encontramos na Noruega, na Suécia, na Holanda e em muitos outros países ricos. Tirar 20 ou 30 minutos ao Lisboa-Porto, à custa de um investimento de cerca de 7,5 mil milhões de euros, não terá qualquer repercussão na economia do País.

Dado hoje ser um projecto praticamente não financiado pela União Europeia, será um presente envenenado para várias gerações de portugueses que, com mais ou menos engenharia financeira, o vão ter de pagar.

Com 7,5 mil milhões de euros podem construir-se mil escolas básicas e secundárias de primeiríssimo mundo que substituam as mais de cinco mil obsoletas e subdimensionadas (a 2,5 milhões de euros cada uma), mais mil creches inexistentes (a 1 milhão de euros cada uma), mais mil centros de dia para os nossos idosos (a 1 milhão de euros cada um).

Ainda sobrariam cerca de 3,5 mil milhões de euros para aplicar em muitas outras carências, como a urgente reabilitação de toda a degradada rede viária secundária.

9/22/2007

A Erva Maria


Neste verão, voltamos à Catalunha, mais uma vez ficamos em casa de amigos.
A Kira, catalã de gema, oriunda de uma família das montanhas, contou-nos uma história deliciosa.
Nos início dos anos 90, a Kira tem à volta de 35 anos, os avós que viviam numa aldeia junto aos Pirenéus catalães, vieram passar dois meses a Barcelona, a casa do filho (pai de Kira), porque foi preciso fazer obras na casa da aldeia.
Os pais da Kira, pessoas educadas, cultas, e tolerantes, tiveram uma conversa com os filhos adolescentes: Os vossos avós vêm cá para casa durante dois meses, vocês têm essas plantas de Marijoana aqui na varanda, os velhotes vão perceber... Cabe-vos aos dois explicarem principalmente à vossa avó que planta é essa....
A Kira e o irmão (um ano mais velho) prepararam uma apresentação:
Reuniram a documentação que provava que a canabis é inocula, que faz bem à asma, ao glaucoma e às enxaqueca. Encontraram um daqueles vídeos a fazer a apologia da erva. Arranjaram exemplos históricos. Fotocopiaram reportagens de revistas holandesas. Enfim fizeram aquilo que a malta toda da minha geração já fez um dia que é reagir ao absurdo que é a proibição de uma planta (como se uma lei pudesse mandar na natureza) com outra absurdo que é transformar essa planta numa bandeira de liberdade.
Assim que os velhotes chegaram a Barcelona, a Kira e o Irmão foram-se sentar com os avós e fizeram a apologia.
Mostraram papeis, vídeos e fotografias. Falaram nos benefícios e na repressão politica. Falaram nos americanos a proibirem o cânhamo para protegerem as industrias do álcool e da celulose. Na repressão que os estado espanhol faz em Ceuta. Na dureza da vida dos camponeses em Marrocos. Em como a histeria da luta contra a droga serve para justificar mais e mais polícias...Explicaram a injustiça da proibição e a possibilidade de serem presos só porque a planta cresce no vaso.
Os velhotes ouviram calados com muita atenção.
Ambos na casa dos 80. Ele, militante do POUS, veterano da Batalha do Ebro, ex-preso politico e troskista. Ela, comunista, militante do PCC, veterana da frente aragonesa, anti-clerical e completamente estalinista.
Acabado o discurso, diz o avô:
-- Pois se a Coroa em Madrid proíbe a coisa, eu sou a favor!!!
A avó que em matéria revolucionária não gostava de ficar atrás do marido, remata.
-- Em relação a essa matéria, eu não só sou a favor, como quero já beber um desses chás!!
Acabadas as obras na aldeia, os octogenário saíram de Barcelona voltaram para a montanha com mais umas sementes na bagagem.
Até à morte da avó da Kira, já no limiar do ano 2000, na sua aldeia dos Pirenéus, as velhotas amigas, recorriam à camarada para obter a “Erva Maria” que faz um chá que tira completamente a dor de cabeça.

9/21/2007

Filiberto Ojeda

Filiberto Ojeda naceu em 26 de Abril de 1933 na localidade de Naguabo, Porto Rico.

En 1967 fundou com outros companheiros o Movimento Independentista Revolucionario Armado que lutou pela libertação de Porto Rico em relação à colonização norte-americana.
Dez anos depois, em 1977, Ojeda criou o Ejército Popular Boricua mais conhecido como "Los Macheteros".

No dia 12 de setembro de 1982, os Macheteros com o apoio de alguns camaradas do Partido Panteras Negras, assaltaram um camião de transportes de dinheiro no Novo México. Com este dinheiro, aproximadamente sete milhões de dólares (1/4 da indemnização que o Mourinho vai receber) criaram uma campanha de insubordinação e de resistencia que agitou o mundo e pôs em causa a permanência do imperialismo norte-americano em Porto Rico.


Há coisas que os gringos não perdoam: catar-lhes os trocos é uma delas
Filiberto Ojeda foi preso em finais de 1989. Apesar disto, os juízes americanos não o conseguiram condenar porque nunca ficou provado o seu envolvimento no assalto. Mesmo sem condenação, foi imposta a Filiberto o uso da infame pulseira eletrónica.

Em 23 de septembro de 1990, num gesto simbólico de comemoração do "Grito de Lares" que marca a independencia de Porto Rico, Ojeda anunciou publicamente que se iria libertar da pulseira que os gringos lhe ofereceram.
Nesse dia, arrancou a pulseira e saltou para a clandestinidade.
Um mergulho de quinze anos. Quinze anos de trabalho, de luta, de produção de muita propaganda e muita agitação. Quinze anos a trabalhar escondido e sem sair de Porto Rico.

Em 2005, num outro 23 de Setembro, agentes da CIA e do FBI rodearam uma casa humilde em Hormigueros, um bairro popular de Porto Rico. Os moradores estranharam o aparato mas não perceberam o que estava a acontecer até ter terminado o tiroteio.
Filiberto, sozinho em casa e com setenta e dois anos, armado com a sua pistola resistiu ao assalto do exercito mais poderoso do mundo.
Nos primeiros disparos do combate, Filiberto Ojeda, foi ferido por um projéctil de arma automática que penetrou junto da clavícula direita e veio a sair pelas costas.
O tiroteio durou três horas.
Milhares de populares rodearam o local querendo saber o que se passava.
O exercito fechou a área e impediu o acesso à comunicação social.
Segundo o FBI, os seus rapazes só entraram na residencia 12 horas após ter terminado o tiroteio porque temiam que o "perigoso terrorista" tivesse escondido explosivos.

A autópsia de Filiberto Ojeda, veio a provar que o guerrilheiro morreu da hemorragia causada pelo único ferimento.

Na sua vil covardia, estes gringos que se armam em super heróis no Iraque, deixaram, propositadamente, este velho morrer sangrando.
Podia ser um conto do Gabu, mas a triste metáfora da terra empapada em sangue foi mais uma vez uma das histórias reais que os jornais não contam e as televisões fazem por não mostrar.

Que neste e noutros 23 de Setembro Filiberto seja recordado.

Por um Porto Rico livre e por uma América Internacionalista.

"Cuba e Porto Rico, são duas asas de um mesmo pássaro". Assim falou José Marti. Que o povo de Porto Rico tenha a ousadia, a coragem e a força necessária para este voo livre."