3/20/2006

A propósito da Comuna que fez no sábado, 135 anos e agora que Paris está (outra vez) ferro e fogo, não quis deixar de partilhar este episódio convosco

Irmão do herói liberal da guerra civil, o Manuel Pinheiro Chagas ficou recordado como historiador e intelectual da última metade do século XIX.
Jornalista de deputado regenerador, o brigadeiro Pinheiro Chagas, como o Eça de Queirós sarcasticamente lhe chamava foi um intelectual do regime.

Quando a comuna de Paris é formada em 1871, o jornalismo que se fazia em Portugal foi unânime em criticar e difundir mentiras e calunias sobre a comuna, e as suas leis. Inventavam-se historias escabrosas e sobre os communards e sobre os excessos da liberdade. As notícias sobre os decretos que falassem em liberdade sexual e em direitos iguais para ambos os sexos, vendiam tinta e chocavam particularmente.

Em Portugal falou-se muito (e mal) sobre o batalhão das amazonas comandado pela Communard Marie Louise. Nada aterrorizava mais a Lisboa burguesa e bem pensante do que um batalhão de mulheres operárias a lutar de armas na mão contra os soldados enviados pelo governo.

Quando a Comuna foi esmagada, e muitos milhares de communards foram assassinados sem julgamento, os jornais portugueses apenas comentaram que a canalha teve o que merecia.

Apesar do massacre contra a mairia de anónimos, alguns dos dirigentes da comuna, num acto de propaganda foram levados a julgamento. Entre os dirigentes levados a tribunal estava a já celebre Marie Louise que ficou conhecida pela Virgem Vermelha na imprensa comunista, socialista e anarquista que por essa Europa já despontava.
A imprensa em Portugal mantinha ainda a sua subjugação aos princípios burgueses (alguma vez deixou de ter?!?!) e crucificou a Marie Louise.

Um dos jornalistas mais críticos à comuna foi, como não podia deixar de ser, o brigadeiro Chagas. Numa linguagem elitista e debitando lugares comuns (o que de resto é próprio dos intelectuais de regime) o brigadeiro Chagas escreveu um artigo de opinião que pretendia ter graça.
No seu artigo sugeria que se fosse em Portugal (país referencia!!!!) nem valia a pena julgarem a Marie Louise. Segundo o Chagas, para por essa mulher na ordem, bastava levantarem-lhe as sais e dar-lhe um bom ar de açoites!!!!
No seu machismo bacoco o assumidíssimo Pinheiro Chagas defendia assim a violência doméstica contra os males da emancipação das mulheres.

O Revolução Social, um dos primeiros portugueses jornais ligados à Associação Internacional dos Trabalhadores (1º movimento internacionalista que aliou comunistas, socialistas e anarquistas) decidiu responder ao Pinheiro Chagas.

O jornalista e professor primário Manuel Joaquim Pinto escreveu a resposta. O Professor Joaquim Pinto dava aulas naquilo que se chamava o Ensino Livre (e gratuito acrescentamos nós) numa escola que funcionava no Largo Calvário, em Alcântara, (por cima da Videoteca Municipal de Lisboa). A escola de Ensino Livre era administrada pela Associação Promotora da Educação para a Infância de Lisboa. Esta Associação, que ainda hoje existe e onde ainda hoje funciona uma escola, servia sobretudo para proporcionar o acesso à educação aos filhos dos operários das fábricas que durante o século XIX se fixaram em Alcântara.

No seu artigo na Revolução Social, o professor Joaquim Pinto, explicou ao Pinheiro Chagas a deficiência dos seus argumentos e a baixeza das suas razões.

O Pinheiro Chagas, teve algumas dificuldades para entender o conteúdo do artigo. Assim, escreveu uma carta para o Joaquim Pinto pedindo explicações.
Habitado a explicar, o pedagogo anarco-cumunisa, saiu de Alcântara directo ao parlamento que já era em São Bento. Seguindo a sugestão do próprio Pinheiro Chagas, feita a propósito da Marie Louise, adaptou o método, assim, não deu lhe deu um par de açoites mas sim um par de bengaladas. Das rijas, à antiga portuguesa!!!

O Joaquim Pinto, foi julgado e condenado. Cumpriu dezoito meses de prisão e pagou uma multa.

Na prisão da Nova Caledónia para onde foi desterrada, a Marie Luise, escreve uma carta (publicada no Crie du Peuple em 1888) solidarizando-se com os camaradas portugueses.

O Pinheiro Chagas ficou com os cornos partidos e transforaram-no num heroi nacional e num márir às mãos da canalha socialista, mas as bengaladas, essas nunca ninguém lhas conseguiu tirar.

1 Bocas:

At 1:15 da tarde Blogger Helder Miguel Menor said...

Que as mudanças são necessárias não há duvidas... mas quem tem de mudar é onde está o busílis da questão!!!!
Não são os direitos dos trabalhadores que devem ser postos em causa... são os deveres do patronato que devem ser cumpridos.
Ai em França a questão passa sem dúvida pela instabilidade do emprego.
Quanto ao código de trabalho não é tão avançado como o nosso?
Em França como em Portugal a solução para equilibrar as finanças públicas é a mesma:
Nos lucros das empresas de serviços está a saída para a crise económica e social... 25% dos lucros da banca, das seguradoras e empresas de telecomunicações daria para manter a segurança social francesa até 2100...
Cá em Portugal ainda dava para mais tempo porque a responsabilidade social das empresas em Portugal ainda é mais difusa do que em França.

 

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