4/17/2007

Da Guerra Fria até às eleições na Nigéria -- O percurso da interferência


Com o desmoronar do império colonial português, a partir de 1974, aquilo que África do Sul considerava a sua “cintura de segurança” deixa de existir.


Angola e Moçambique deixam de ser escudos protectores, bem como fornecedores de mão-de-obra barata e de recursos naturais para Pretória; o movimento de libertação da Namíbia – Swapo – e a resistência negra na Rodésia colonial tornam-se mais fortes, enquanto um movimento simultâneo exterior e interior questiona o regime de apartheid na própria África do Sul.


Os soviéticos, apoiam a luta politica dos povos na Somália e na Etiópia. Com um regime marxista já estabelecido no Iémene, na outra margem do Estreito do Bab el Mandeb, são construidas com o apoio dos russos amplas bases aéreas e navais em Massua, na Etiópia, e na Ilha de Dhalak, no Mar Vermelho, colocando a estratégica região do Chifre da África fora do controle dos Estados Unidos.


Pela primeira vez desde sua criação, no século XIX, o Canal de Suez deixou de estar sob a alçada daquilo que se chama as “potencias ocidentais”, o acesso ao Oceano Índico e o Golfo Pérsico ficou assim acessível ao mundo socialista.


Aos poucos, a Guerra Fria, em sua última fase – a chamada Segunda Guerra Fria, a partir de 1979 –, instala-se no coração da África. Os Estados Unidos, até então pouco envolvidos nos negócios africanos – dado o seu esforço de guerra ter estado até aí localizado no Vietname – decidem atacar indirectamente o continente africano, procurando bloquear a crescente viragem à esquerda do continente.


Através da CIA e do exército da África do Sul, os norte-americanos, apoiam os movimentos mais reaccionários do continente, como a Unita, em Angola, Charles Taylor, na Serra Leoa, inúmeros grupos terroristas no Zaire e em Moçambique, além, é claro, do racista National Party, em Pretória.


No final dos anos 70, África tende a transformar-se num continente socialista. Pelo menos é essa a vontade dos povos. O movimento comunista internacional tem forte pontos de apoio na Líbia, na Etiópia, por algum tempo na Somália, na Guiné, no Congo/Brazzaville, em Angola e Moçambique. Para além destes países claramente socialistas, há uma grande simpatia em países da chamada “linha de frente” da luta contra ao apartheid, como a Zâmbia e a Tanzânia.


Entretanto, a partir de 1985, com a crise geral do sistema soviético, os Estados Unidos e a África do Sul movem as suas peças no tabuleiro africano, é então o colapso de vários regimes pró-soviéticos, sendo a Etiópia o melhor exemplo. O vazio estratégico criado pela retirada dos soviéticos e cubanos e a força das intervenções assumidas e dissimuladas do imperialismo americano cria movimentos profundamente reaccionarismos em oposição ao socialismo. Foi a porta que se abriu para o fundamentalismo islâmico na África oriental.


Em alguns países, como a Etiópia e a Somália, abrem-se períodos de crise, instabilidade e guerra civil, culminando no caso da Etiópia, na secessão da Eritréia.

No caso da Somália, bem mais complexo e dramático, chega-se ao completo colapso das estruturas estatais existentes, com a pulverização do Estado-Nação e a hegemonia de “senhores da guerra” locais, muitas vezes apoiados por organizações terroristas, como a Al Qaeda e o Ansar-El-Islam.


Já em outros países, como em Angola e Moçambique, a desaparição do clima de guerra fria Ocidente/Oriente acaba por abrir caminho, não sem muita dor e destruição, a processos de paz, de frágil densidade.


Na África do Sul, por sua vez, a legalização dos partidos de resistência, como o Congresso Nacional Africano (Coligação de partidos de esquerda da qual faz parte o Partido Comunista da Africa do Sul), em par ao lado da intensidade da resistência local e da condenação externa, acaba por levar fazer ruir o sistema da segregação racial. A partir de 1990, temos a legalização do CNA, o fim do apartheid em 1991 e só depois a eleição de Nelson Mandela em 1994.


Mas outros países não tiveram a mesma sorte: o desmoronar das ditaduras que eram sustentadas pelo Ocidente, como no Congo/Kinshasa, no Ruanda, na Libéria, entre outros, acaba por gerar uma grande instabilidade política, gerando um estado contínuo de guerra, perpassados por genocídios brutais, como em Ruanda em 1992 e 1994.

Paralelamente com a expansão das guerras locais e dos genocídios, a fome reaparece em vastas regiões avassaladas por tragédias climáticas, como no Niger ou no Sudão. Mais fome provocada pela guerra permanente, como na Etiópia e na Somália.

No sul da África, bem como na África Oriental, as epidemias de turberculose e sida atingem parcelas assustadoramente amplas da população local, enquanto na África Equatorial a malária, o dengue e o vírus Ebola são as razões das elevadas taxas de mortalidade.


No pós-Guerra Fria abriu-se um novo ciclo de expansão dos interesses ocidentais na região, em especial uma nova expansão anglo-americana, tendo como países-pivô na África Oriental e Austral o Uganda, pós-Idi Amim, e a nova África do Sul.

Esta ofensiva anglo-americana, dirige-se para a dominação do Congo/Kinsahasa, com suas riquezas minerais, e tem vindo a conseguir a eliminação da hegemonia francesa local. Cabinda, com suas riquezas petrolíferas, é um alvo secundário, porém bastante importante. Ainda na Africa Ocidental, a Nigéria é um território onde os norte americanos não querem perder o poder.


Na Africa Oriental, o Zimbabué é tambem um objectivo a controlar.


Por estes dias estão a decorrer eleições na Nigéria. Eleições denunciadas por todos como falsificadas e baseadas no método do leva-porrada-e-vai-votar. Fala-se em 200 mortos. Os diplomatas norte-americanos dizem que são eleições livres.


Os telejornais internacionais mostram os 30 estudantes do tiroteio na universidade da Virginia. Só se fala no tiroteio. Nas familias, no primo, no piriquito, no cão e no canário das vítimas. Os mais sérios, falam na lei que permite a um puto de dezoito anos, nos estados unidos comprar metralhadoras no super-mercado com cartão de crédito. O Bush vem dizer que tem pena.


África não existe.


Quando as televisões internacionais, entre as 2 e as 4 da manhã, falam de África é para lembrarem nos “heróicos” opositores ao Mugabe.



Hoje de manhã, um adido de imprensa da embaixada norte-americana (o que quer dizer um agente da CIA) em Lagos na Nigéria, deu uma entrevista pelo telefone para a RDP África. Dizia que estava tudo a correr na normalidade e que o processo eleitoral estava a correr limpo porque ainda não tinham entrado queixas em tribunal....

O mundo pode dormir outra vez descansado. Se a CIA diz que na Nigéria as eleições são livres, é porque a democracia continua a avançar em África.

5 Bocas:

At 4:53 da tarde Anonymous Anónimo said...

é o kit democracia com generosas vantagens...

 
At 9:29 da tarde Blogger pinhacolada said...

Ó Sostrova, o que é que tu achas de um bacano k veio a fugir de Moçambique porque diz k os queriam matar por serem brancos(!), e que me diz que África tem tantas riquezas e possibilidades que nunca a deixarão sair da miséria? Ele acha, aliás, tem a certeza de que na altura do Salazar e do Estado Novo aquilo funcionava melhor, até se verem apanhados no meio da Cold War/Guerra Fria.

 
At 10:30 da manhã Blogger Helder Miguel Menor said...

O que é que te queres que te diga?
Esse senhor talvez tenha algum saudosismo do tempo colonial.
Sobre fugir de Moçambique por ser branco, quem sou eu para duvidar... Mas tambem é verdade que muitos moçambicanos brancos ficaram e construiram o país contra os interesses das potencias estrangeiras...
Se calhar a sociedade em que esse senhor queria viver era uma sociedade construida na base da segregação.
Se calhar esse senhor acha que por ser branco devia ter mais direito do que os outros homens que são negros.
Recordo com mágoa e com vergonha, como alguns ex-colonos de Moçambique que emigraram para a Africa do Sul fizeram manifestações a favor do aparthaid nos anos 80 onde exibiram a bandeira de Portugal.
Se Moçambique funcionava melhor antes da guerra-fria não sei. O que sei é que em Moçambique como no resto do império colonial português a justiça social e politica era inexistente. Recordo o "estatudo nativo" um documento aprovado pelo estado novo em que o direito ao voto era sonegado aos homens negros... Talvez seja essa a ideia que esse senhor tem de uma sociedade que funciona bem. Eu não acredito numa sociedade em que a cor da pele seja motivo para segregar.

 
At 5:25 da tarde Anonymous Anónimo said...

Os comunas só fizeram merda em Africa como estão agora a fazer no Barreiro.Os pretos sem os brancos a mandar não se governam.

 
At 10:46 da manhã Blogger Helder Miguel Menor said...

O que é que se diz a um imbecil destes?
Nada.
O melhor a fazer com os fascistas é o principio dos pecevejos: ignora-los enquanto pudermos quando não der mais para ignorar. esmga-los e depois limpar o sapato.

 

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